Disneilêndias

terça-feira, abril 11, 2006

Chapt 10.

Eureka! A resposta era começar a matar os piolhos enquanto os funcionários da Serviços & Serviços pensavam um modo de controlar essa classe perigosa, porém emergente formada pelo mendigo e seu mais novo escudeiro, ou melhor, leiteiro.

O mendigo se enfiltrou na mata para buscar uma erva, que segundo os seus ancestrais indígenas lhe haviam dito, dava diarréia em qualquer bicho. O mendigo almoçou a erva, mesmo sabendo que seu organismo era o mais resistente para comida estragada e que possivelmente a erva não se manifestaria nele de maneira violenta. Pensou errado. Foram muitos dias tendo de conviver dores e odores estranhos. Passada a fase de testes, ele se dirigiu ao farmacêutico entediado. Era agora ou nunca. Ficou para depois do almoço.

quinta-feira, abril 06, 2006

Resultado Parcial

Devido à grande procura e falta de como comportar tantas opções o concurso foi sumariamente cancelado e o pente fino será entregue à leitora Karla Nazareth. Será postado a matança de um piolho em breve.

sábado, março 18, 2006

Chapt 9.

O anão não quis perder muito tempo. Despediu-se de maneira genérica e voltou galopando num pônei para o acampamento da Serviços & Serviços. Estava decidido a pensar uma tática de convencimento promissora, jovial e moderna. Reuniu-se com os estagiários e os publicitários. O staff parecia se articular, enquanto os moradores retomavam suas rotinas.

A cidade acordava, urinava, cuspia, comia, arrotava e rezava cantando, como de praxe. A saudade dessa vida regrada fez com que um filho pródigo retornasse ao lar. É o atual vendedor de leite semi desnatado que conta sua trajetória.

Ainda adolescente, percebeu que tinha uma missão a ser realizada no planeta. Juntou um dinheiro e rumou em direção a São Juscelino, uma megalópole cosmopolita. O nobre propósito era vender cadeiras de praia numa tentativa de institucionalizar a conversa de porta, ou melhor, o bate-boca de vizinhança, ou melhor, o leva e traz e assim por diante a preços de fábrica. Imaginava que a classe média citadina não se conhecesse muito bem, nao falassem mal mas também não falassem bem uns dos outros, e isso tudo dificultaria em caso de uma guerra, duma calamidade pública ou de uma promoção da tv a cabo. Daí as cadeiras de veraneio. Infelizmente falhou logo na viagem de ida, foi parar numa tal de São Paulo, muito mais esquisita e irreconciliável.

O mendigo se mostrou indignado. Cadeiras de praia? Que mané. Resolveu cooptar o cidadão.

- Olha, querem me ferrar. Como fizeram comigo no verão de 87.

- O que aconteceu em 87?

- Agora. Uma turma aí. E como se não fosse muito, eles já entraram na cidade, trocaram o nome, montaram uma câmara de deputados. Eles... eles querem acabar conosco.

- Eles conseguiram mudar o nome da cidade. Que bom!
- Você não está entendendo. Agora além de um desvio ortográfico, nós temos um desvio parlamentar.
- Ah.
- Eu preciso de sua ajuda.
- O que posso fazer?

O mendigo palitava uma cera no ouvido enquanto imaginava uma resposta.

domingo, março 12, 2006

Chapt 8.

Enquanto o destino do mendigo estava amaldiçoado pelas forças do capital, um alemão dono da loja de animais empalhados estava aos redores da praça oferencendo suas mercadorias aos visitantes e aproveitando para queimar umas onças ponta de estoque: queria dinheiro com uma certa urgência. É que a alemã andava com umas vontades de voltar para terrinha.

- Tem que vender tuda, precisa sair daqui, piolho coça e não dá nem para uma empalhadinha, é um bicho ruim, teimoso! - dizia a destemida alemã.

- Sim. Ontem consegui vender uma cabeça de avestruz prum dessas...

- O QUÊ?? - a mulher berrou com muita força, pois estava com o aparelho auditivo desligado.

"Que diferença faria?" pensou o marido.

- TE PEGO AGORA, GORDINHAAA! HAHAHA!

- HAHAHAHA!

Os dois começaram a correr em volta da mesa de jantar. Os filhos do casal, donos do cachorro que despejou o mendigo, começaram a correr também em círculos, no que parecia uma terapia familiar bem disciplinada. Enquanto isso a praça estava fervilhando com os piolhos e os seus donos. A logomarca estava se firmando na mente daqueles cidadãos. Não conseguiam mais pensar em nada, nem em McFritas. E o mendigo ainda dormia, numa valentia excepcional. Não demorou muito. Um anão, segurando uma cabeça de avestruz, foi acordá-lo.

- Hãn? - primeira reação que se esperava do mendigo ao ver aquela figura inacreditável, quase onírica, ao mesmo tempo horripilante, o sabonete.

- Boa tarde. Estamos aqui para servi-lo. Você já pode acordar e tomar um banho. Há um cadastro sensacional esperando por você na praça. - disse o anão, com uma diplomacia telemarketiana.
- Eu estou na África? - o mendigo já estava se arrependendo de ter comido feijão potencialmente estragado há cinco horas atrás.

- O senhor está em Disneilêndias!

- Peraí, eu não conheço essa cidade. É algo além de Uberaba, assim, pro norte?

- Já vamos lhe explicar com todo o prazer. Está aqui o sabonete, a toalha e um crachá.

O mendigo gostou da toalha, colocou o crachá dentro do seu saco plástico do Carrefour com seus objetos de uso cotidiano - um espelho, uma tampinha de refrigerante, um pente quebrado, uma foto da mãe e uma figurinha colante do Super-homem. Guardava a figurinha para usar no dia de seu casamento e considerou o crachá uma relíquia de mesmo valor. Por fim recusou o sabonete. Argumentou que não iria tomar banho, porque não o fazia há muitos anos desde que em férias familiares um peixe entrou lhe no ânus e doeu à beça para tirar o cardume que entrou em seguida, apesar de ter feito uma fritada depois bla bla blá... O anão não acreditava muito, no entanto continuava sorrindo com aquele jeito de "mas parcele sem juros no cartão de crédito". Chegou o momento da tentativa de suborno.

- Você ficará com um dos ministérios de Disneilêndias. Basta cooperar.

- Eu já te perguntei onde é esse raio de cidade, é sul ou norte de Uber...?

- Você está nela. Não se preocupe.

- E o Jardim lá não sei das quantas?

- Também é aqui. Iremos mudar a vida de todos.

- A minha não. E não mostrarei minha traseira para os peixes de novo.

O combate estava travado.

quarta-feira, março 01, 2006

Chapt 7.

Eles chegaram.

Helicópteros & helicópteros da multinacional Serviços & Serviços Inc. aportaram no centro da praça. Primeiro desceram uns anões de jaleco que iriam abrir passagem para uns caras muito legais, pois estavam prestes a também descer, só que dum modo muito mais legal. Usavam terno preto e gravata, óculos escuros, tênis e mochilas com o logotipo da Serviços & Serviços Inc. Foram até o palanque do prefeito, e depois de uma conversa de aproximadamente quarenta e três minutos, essas pessoas interessantes começaram a falar da natureza e seus elementos: fogo, terra, água e ar. Depois explicaram durante mais quarenta e três minutos, através de uma vídeo conferência, a missão da empresa no planeta: criar e resolver problemas. Em nome de um chamado anônimo, eles estavam ali para detonar os piolhos a um precinho irrisório. Não valia nem a pena comentar.


Todos ficaram e ficariam - os que ainda não tinham entendido nada - muito maravilhados com tudo. Só quem parecia não se impressionar com nada era o mendigo. Com toda aquela bafuzaca, ele somente deitou e virou para o outro lado, aproveitando, assim, uma parte menos suja do papelão onde dormia desde que fora despejado de maneira audaz de sua antiga residência particular, uma casinha de cachorro, agora muito mal frequentada por uns alemães de raça superior. A atitude de resistência do mendigo ao progresso não passou desapercebida. Logo ele sofreria uma terrível punição pela ousada transgressão.

sábado, fevereiro 25, 2006

Chapt 6.

O prefeito se decidiu por fazer um pronunciamento extraordinário àquela gente. Reuniu os habitantes em praça pública e começou a discursar. Estava, na ocasião, protegido com touca de natação e traje aeroespacial. Gordo como estava ficou com coxa e barriga completamente apertadas no couro branco da roupa. Começava a fazer calor. Muito calor.

- Meus caros e minhas caras, há quanto tempo sou o prefeito desta linda cidade e líder querido pelo povo?

Todos coçavam a cabeça.

- É mister - prosseguiu - que eu e a prefeitura tomemos uma atitude perante a calamidade dos piolhos.

Temia-se que a atitude tivesse a ver com a distribuição de fantasias engraçadas como aquela que o prefeito estava usando.

- Esta semana começo a trabalhar arduamente para acabar com pulgas, piolhos, lêndias, micoses e o homossexualismo de minha mulher com a empregada.

A esta altura, o prefeito era ovacionado com toda a energia que as mãos dos cidadãos conseguiram acionar.

- Com o meu colester...

- Veja, prefeito!

Um véu negro cobria o céu. O sol desaparecia totalmente e o vento uivava de maneira atípica. Cabelos e notas fiscais voavam. Até uma neblina apareceu. Todos sentiam frio, calafrios e frieiras. Olhavam-se com medo. Daí corriam em slow motion como no clip de miss sarajevo. Logo após ninguém mais se via. Uma atmosfera sinistra e elétrica tomava conta de Jardim das Valquírias. E, finalmente, aconteceu o que estava por vir.

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Chapt 5.

A raça parasita estava inequivocadamente agitada. Funcionários da prefeitura, advogados e fofoqueiros corriam para todos os lados sem saber que atitude não tomar.

Já é sabida a indisciplina reprodutiva dos piolhos. Inominável, indizível, inexplicável. Pulam de cabeça em cabeça. Alguns são nômades e a maioria topa qualquer aventura. É possível identificar preferências. Os couros menos lavados viram lar-doce-lar. A cabeça do único mendigo da cidade passa por uma especulação imobiliária complicadíssima. De conquistas sublimes, uma civilização estava nascendo. Um novo império.

Em Jardim das Valquírias - até esse post aquela associação ainda não se resolveu por outro nome - o cotidiano e os assuntos começavam e terminavam com coceiras indisfarçáveis. A tipografia até gostaria de aproveitar a epidemia para dirigir ataques às autoridades políticas, mas a impressão ficou sem responsável desde que o rapazote que dela cuidava se atirou dentro do maquinário afim de ter paz.


O medo, o pânico e a falta de informações fez os cidadãos despertarem para o significado da vida. Não faltaram compras exorbitantes por teleshop, infidelidades conjugais e guerras de travesseiro. A população estava se armando para o amanhã.